Episódio 2 “Eficiência Energética e Capacidades de Defesa”
SINOPSE: Diante do grau de incertezas do século XXI, tanto em tempos de paz quanto em tempos de guerra, os Estados têm que estar constantemente preparados e capacitados para lidar com ameaças à soberania nacional das mais diversas proporções, e entre elas, encontra-se a mudança do clima. Este fenômeno impacta, por exemplo, a segurança energética e a segurança alimentar, em especial em Estados subdesenvolvidos e em desenvolvimento, acentuando e escalonando conflitos com repercussões internacionais.
Secas recorrentes e inundações repentinas, por exemplo, estão minando a produção agrícola e pecuária em áreas no Quênia, perturbando a pesca nos principais lagos e aprofundando as tensões entre as comunidades locais, que já estão no limite. O aumento do deslocamento da população está gerando ciclos de feedback negativos, enquanto os grupos armados lucram com instabilidade para expandir sua influência em toda a região. De acordo com dados recentes divulgados pela Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN), as alterações no clima levaram a 29 mobilizações militares internacionais em 2023 para responder a emergências em 14 países. Daí a importância de que autoridades políticas e militares brasileiras estejam atentas a esses riscos e envidem esforços para preparar e capacitar as Forças Armadas, aumentando assim a percepção de segurança do povo e garantindo a soberania nacional diante das mudanças trágicas que alterações climáticas podem provocar no país, haja vista a recente tragédia no Rio Grande do Sul.
Sob a ótica do aumento da vantagem operacional nos teatros de operação, os Estados mais desenvolvidos têm realizado investimentos constantes para preparar e capacitar suas Forças Armadas, de modo a aumentar as capacidades de Defesa. Isso significa que estes Estados estão realizando investimentos significativos em maior autonomia, maior velocidade, maior mobilidade e maior furtividade dos meios militares de suas Forças Armadas. A EMBRAER já está realizando testes com combustíveis sustentáveis de aviação (SAF, na sigla em inglês) em seus aviões comerciais. A Vale do Rio Doce firmou acordo com a Petrobras para testar biocombustíveis em navios operados pela Vale.
O processo global de transição energética tem gerado diversas oportunidades para as Forças Armadas, dentre elas a associação do aumento da eficiência energética dos meios militares ao aumento da capacidade de Defesa, a geração de combustíveis sustentáveis inovadores e as surpresas estratégicas. Diversos combustíveis sustentáveis, como hidrogênio, biocombustíveis, sistemas de armazenamento de energia, pequenos reatores modulares e microrreatores nucleares, têm sido apontados como as principais tendências em inovação tecnológica militar do futuro.
As surpresas estratégicas são um dos principais transbordamentos do emprego destas inovações tecnológicas nas próximas guerras. O conceito de surpresa estratégica pode ser compreendido como a percepção repentina de que um Estado está operando com base em uma percepção errônea de ameaça. Ocorre através da incapacidade de um Estado prever, e muito menos se antecipar, a uma ameaça externa aguda e imediata aos seus interesses nacionais vitais. Da mesma forma que, por exemplo, combustíveis sustentáveis inovadores podem ser uma ameaça aos interesses vitais do Brasil em futuros teatros de operações, meios militares brasileiros que empregam estes combustíveis podem causar surpresas estratégicas às ameaças externas em teatros operacionais.
Discutiremos neste episódio, portanto, uma das inovações lançadas no estudo “Descarbonização e Sustentabilidade no Setor de Defesa: eficiência energética e novas capacidades de defesa”, escrito por Fernanda Corrêa e publicado pelo Centro Soberania e Clima: a necessidade dee associar o aumento da eficiência energética, por meio do emprego de combustíveis sustentáveis, ao aumento das capacidades de Defesa e a possibilidade de evitar e/ou gerar surpresas estratégicas na condução das próximas guerras.
Talking points e perguntas:
- O que são capacidades de defesa?
- Existem linhas de financiamento público no Brasil voltadas para investimentos em tecnologias verdes aplicáveis à área de Defesa?
- Por que algumas autoridades políticas e militares resistem em considerar como estratégico o tema das mudanças climáticas em assuntos de Defesa? Como isso pode impactar no processo de inclusão de tecnologias verdes/sustentáveis em nossas capacidades de defesa?
- O Setor de Defesa brasileiro pode também contribuir para a meta nacional de redução de emissões de gases de efeito estufa, conforme previsto na NDC? De que forma?
- É possível a convergência entre interesses das agendas de soberania e de clima quando se fala sobre eficiência energética na defesa?
- Qual a relação entre aumento de eficiência energética de meios militares e surpresas estratégicas no curso de guerras?
Quadro “Rádio Soberania e Clima”: Relato da Dra. Fernanda Delgado, CEO da ABIHV, Associação Brasileira da Indústria do Hidrogênio Verde.
Participantes:
Capitão-de-Mar-e-Guerra da reserva da Marinha, Engenheiro Naval e Oceânico (PhD) e Nuclear (MSc), é membro titular da Academia Nacional de Engenharia ANE. Atualmente é Coordenador do Comitê de CTI da Amazul SA e Diretor Técnico da ABDAN. Foi Diretor-Presidente da Eletronuclear e Coordenador do Programa de Propulsão Naval do CTEMSP. Faz parte dos grupos de assessoria do Diretor-Geral da AIEA em energia nuclear e em responsabilidade civil por danos nucleares. Foi conselheiro de administração da WNA e Presidente da LAS/ANS.
Dra. Tamiris Santos tem pós-doutorado e doutorado em Estudos Estratégicos Internacionais na UFRGS, ambos fruto de pesquisas em projetos financiados pela CAPES em conjunto com o Ministério da Defesa. Mestrado em Integração da América Latina na USP e Bacharelado em Relações Internacionais na Unibero. Pesquisadora associada no Projeto NETZMIL e na Universidade de Loughborough, tem publicações a respeito de gestão de defesa, operações militares conjuntas, interoperabilidade e inovação militar, atuando no Brasil como pesquisadora convidada no projeto Procad ASTROS e na Rede de Pesquisa sobre Estudos de Segurança e Defesa (REPESD), e no Reino Unido, na ‘Military Innovation Network’, rede de pesquisadores interinstitucional sediada no Centro de Ciência e Estudos de Segurança (CSSS) do King’s College London.